sexta-feira, 27 de maio de 2011

Deusa Hera

Coloco aqui um texto de um site Helenista que vem ajudar a esclarecer alguns conceitos difundidos de forma erronea entre os pagãos e simpatizantes. E mais abaixo textos coletados de fontes diversas. Mas todas citadas aqui. Vamos deixar de lado um pouco a má fama de mulherengo de Zeus e a má fama de deusa ciumenta e descontrolada de Hera.Hera, ou Juno, para os Romanos, é a Deusa com que os neo-pagãos mais tem dificuldade (ou melhor, receio) em lidar.

Não só supervisiona o casamento, que já não é tido como o maior objetivo de uma mulher, como é representada por Homero como mesquinha, ciumenta e vingativa (alguns historiadores dizem que a esposa de Homero era assim, já que esta descrição não corresponde a que as outras evidências dão). Mas esta não é, de todo, a verdadeira face da Deusa.
Hera é muito mais que a esposa ciumenta.



Hera, a força por detrás da mudança

Quem é Hera? A mulher ciumenta que castiga as amantes de Zeus e os seus filhos porque não pode punir o próprio Zeus? Esta é, de fato, a imagem que a maioria de nós, na nossa sociedade moderna, temos da Deusa, mas as provas apontam na direção de outra Deusa, uma Grande Deusa, venerada por toda a Grécia como uma igual de Zeus e uma divindade muito amada, não detestada ou temida.
Qual é a força por detrás desta Deusa que pode iluminar as sombras que corrompem a nossa imagem Dela? Será mesmo uma simples, mazinha e vingativa esposa Olímpica? Ou melhor, seria apenas isso ???

Não me parece, nem à maioria dos helenos. Para muitos estudiosos e dedicados a ela, Hera é a Deusa da mudança, do crescimento e maturidade e, como tal, dos obstáculos.

Os seus filhos e filhas operam todos como agentes de mudança:
Ares é a guerra, que representa sempre uma alteração brutal para as pessoas e nações nela envolvidas;
Hefaestus transforma a mais feia pedra na gema mais perfeita;
Ilítia trás os bebes que são sempre uma revolução gigantesca na vida de todos os que os rodeiam; Hebe, a juventude, não passa de uma mera transição para os seres mortais.  A Deusa também é acompanhada por um séquito de divindades cujo domínio inclui sempre a mudança: as Horai, as estações, o ciclo natural, a modificação da Natureza ao longo do ano; as Moiras, os Fados que impõem a mais drástica mudança, a morte; as Cárites, que dão a beleza, mas que a tiram tão facilmente como a deram.

Hera é também chamada Mãe Terra em certas peças literárias gregas e no hino Órfico é anunciada como a que dá vida. Também há evidências que tinha culto como Deusa Mãe e era a ela que as pessoas recorriam quando não conseguiam engravidar (o que é parcialmente explicado pela sua filha Ilítia). Mas como podemos entender tudo isto se a própria Hera não tem uma natureza de sustento, como Demeter, nem protetora, como Artemis, nem de sacrifício, como Gaia?Podemos percebê-lo tomando o mito do seu casamento com Zeus. Nessa ocasião Gaia ofereceu à Deusa as maçãs douradas e, encantada com a sua beleza, Hera semeou as sementes e fê-las crescer. É interessante notar que Ela não criou as maçãs, nem as alimentou, nem as protegeu, simplesmente as plantou e as fez crescer. É este, na minha opinião, o segredo do poder de Hera: a força que concede vida, que faz os seres vivos esforçarem-se para conseguirem, mas que não as ajuda para além de lhes dar o impulso inicial.

O velho ditado: Dá a rede e ensina a pescar.
Por exemplo, consideremos a criação de um bebe mamífero: Afrodite seria a força por detrás do amor e do prazer envolvido no sexo; Priapos permitiria que o macho depositasse o sémen na fêmea. Mas quem estaria por detrás da viagem dos espermatozóides? Por detrás da fecundação por si? E depois, quem estaria por detrás do crescimento? Demeter, Gaia, Leto ou Reia seriam o corpo da fêmea que sustenta o bebe. Poseidon o espírito masculino de fecundação. Mas Hera é a Deusa por detrás da fagulha da vida.  Mas o seu domínio não pára no momento da criação e expande-se para incluir o crescimento, tanto físico como psicológico. Ao longo da vida a Deusa cria obstáculos que nos ensinam algo: uma habilidade nova, uma emoção nova, um conhecimento novo… Ela desafia-nos a crescer e até se não conseguirmos ultrapassar os seus obstáculos ainda aprendemos como não fazer as coisas ou como lidar com a derrota. Provas disto são inúmeros mitos de "vingança" das amantes do seu marido e os seus filhos. (Apesar de eu achar as vezes que existe sim um misto de vingança ... basiquinha. Como qualquer mulher mortal. hehehehe)

Hércules é o exemplo disto. O seu nome significa "glória de Hera", ou "feito glorioso por Hera" e, no entanto, Hera é representada como alguém que insistia em tornar a sua vida difícil: Ela arquitetou os doze trabalhos, Ela levou-o à loucura e o fez matar a sua família, Ela discutiu abertamente com Zeus acerca dele… Ele ultrapassou todos os seus desafios e, no entanto, ele é "glória de Hera" e, mais: Ela abraçou-o quando ele se tornou Deus, tornou-O seu filho e casou-O com uma das suas filhas, Hebe.

Como é que isto encaixa se Eles se odiavam mutuamente, como o mito, aparentemente, deixa transparecer? A única explicação é que Ela o amava desde sempre e todos os obstáculos eram a sua maneira de o ensinar. E, realmente, foram os obstáculos que o fizeram crescer e chegar mais alto que qualquer outro mortal (ou semi-deus). E por aprender todas as suas lições a Deusa recompensou-o.

Outros exemplos são Tifão como um teste a Atena quando Hera diz que gostava de ter sido a mãe da Deusa mais nova, atirar Hefaestus para fora do Olimpo sendo a sua mãe, enlouquecendo Dionísio… Até a Zeus ela ensina modéstia e compaixão ao planejar contra ele e colocar desafios no seu caminho. Esta é a forma da Deusa dizer "Amo-te, preocupo-me contigo e quero que te tornes um Deus/pessoa/animal melhor".  No culto antigo isto estava concretizado nos Jogos de Hera em Olímpia, uma competição em que apenas mulheres podiam participar. Havia apenas uma corrida a pé, onde as mulheres eram organizadas de acordo com a idade e maturidade, representando a corrida o crescimento e amadurecimento das mulheres.Mas como é que o casamento, o tipo estável promovido pela Deusa, assenta nisto tudo?

Primeiro que tudo, o casamento é definitivamente uma mudança na vida e está, normalmente, associado à maturidade.

Na Grécia Antiga o casamento era da mulher, uma celebração centrada no feminino, e no casamento Zeus é referido como Zeus de Hera. A palavra esposa e mulher em grego são a mesma (tal como se usa muitas vezes em português), pelo que o casamento era considerado um passo essencial na maturidade da mulher.
Também é curioso notar que é Hera, e não Artémis, a Deusa padroeira de tudo aquilo que diz respeito às mulheres, desde os festivais, ciclos sexuais, gravidez, até prosperidade e finanças. Artémis é mais Deusa da liberdade e das crianças que da mulher e seu universo, propriamente falando.

 


No fim vemos que Hera é muito mais que a esposa ciumenta que nada faz a não ser planejar a sua vingança: ela é a Deusa do crescimento e maturidade, uma força que nos mantém em movimento, a aprender e a crescer.  Texto baseado em:

http://www.portuskale.org/temenos/temenoi/Hera.pdf  

Nenhum comentário:

Postar um comentário